Acordamos. O dia estava bonito, mas o clima diferente. Deixamos a minha mochila naquela que seria a minha nova “casa” durante os próximos quatro dias, antes de trocar de cidade. Fomos ao parque para conversarmos um pouco mais e partimos. Até o aeroporto, lembro de quase todos os detalhes. Alguns deles são como fotos mal reveladas, escurecidas ou borradas pelas lágrimas. A partir dali, seria o bloco do eu sozinho. Ela voou para o lar. Eu voltei de metrô.
Meter o pé nunca foi uma vontade pessoal. Não fiz o menor esforço para os intercâmbios da faculdade, work experience, nem férias mesmo. Ao olhar para trás, me dou conta que persigo algumas metas pessoais que, quando não estou trabalhando em um projeto alheio, fico focado nelas. Se eu tivesse pensado mais no mercado (ou até mesmo em mim), talvez tivesse feito caminhos diferentes. Mas o lado “pedreiro” falou mais alto, me fazendo construir meus “próprios prédios”, como costumo chamar meus projetos.
Voltando à cena, lá estava eu. Só. No auto-exílio que permitiu a validação de mim mesmo.
Sim, o meu objetivo era me testar. Como é que eu posso querer algo difícil, se não conseguir me virar em outros territórios por conta própria? O mundo é dos bem treinados. E eu estava tentando acreditar nisso.
Diferente de estudar ou trabalhar em outro país, “mochilar” sozinho orienta e desorienta em poucos dias. Não há raízes, nem mesmo superficiais. É como uma navegação, onde cada porto é um novo desafio. Legal ou não, cada lugar é sentido com mais pressão na solidão. Não escapam os detalhes. Não há com quem dividir, nem compartilhar. É você e você. E por mais que se afine com uma ou outra pessoa, daqui a um par de dias todas seguem seus rumos e desaparecem. Inclusive você.
Em meio a tantos ambientes novos, que por algum motivo não me pareciam tão novos assim, foram os livros que fizeram a diferença. E entre 1889, Bhagavad Gita e Getúlio, a citação especial vai para o Roberto Carlos em Detalhes. Sim, o censurado. A publicação foi recolhida. Mas nada que um pdf não resolva.
Ler a trajetória do maior cantor brasileiro, com todos os clichês, me trouxe a inspiração necessária para ir em frente. Não na viagem, mas após. Roberto Carlos, além da história trágica da infância, foi rejeitado por nada menos que todas as gravadoras que tentou cantar. Bateu em tudo quanto é rádio, cantou na noite, foi acusado de plágio de João Gilberto e, por pouco, quase não fica na última gravadora, a que topou gravá-lo. Há coisas que não se explicam. Ele virou o jogo e se tornou o que você já sabe.
E a pergunta era: se eu não tenho esses problemas todos, por que ainda fico me preocupando?
Depois que eu desci daquele metrô, apesar de todo o peso da separação temporária, comecei uma outra jornada que terminou na última semana, voltando pra casa, com a cabeça fervilhando, pensando sobre como é começar do zero.
Ah, e quando eu cheguei no portão, a minha cachorra também me sorriu latindo.